sexta-feira, 30 de maio de 2008

Os sonhos que a terra ainda há de comer.


A pergunta que não cala em mim, é a mesma toda manhã.
Toca o despertador pra mim trabalhar e eu sempre penso...
Quando minha vida vai começar?
Porque o modelo ideal que me apresentaram é bem surreal.
Digno de propaganda de margarina. Aquelas que você assiste e conclui:Isso que é vida!
Café-da-manhã gostoso, dona-de-casa gostosa, criançada sorridente e maridão passando a manteiga.
E você automaticamente se coloca na posição de quem vive uma pré-vida.
Estudando, trabalhando, pra algum dia ser alguém.
Adiando a vida. Deixando pra depois. Pra ser, só quando crescer.
E isso eu não entendo.
Não entendo porque todo mundo prefere viver assim, de sonhos.
Talvez porque é muito chato realizar. A realização é sem graça e a sensação de tarefa cumprida, não emociona.
Quando o sonho acontece, ele nem é mais sonho.
Porém viver deles é apenas uma parte do problema.
A outra, é sonhar diferente de todos.
Eu nunca entendia porque me perguntavam o que eu queria ser quando crescesse.
Como assim? replicava eu. Aí vinham os exemplos ( dentista, advogada, engenheira..) e com eles minha vergonha de responder.
Em pensamentos eu respondia: escritora. Em palavras eu respondia: Dentista.
Os olhos familiares pestanejavam aliviados quando ouviam minha sensata escolha.
Ufa! mais uma pessoa normal na família.
Ate meu primo decidir jogar no outro time e acabar com essa normalidade.
É feio fugir do padrão.
Da beleza enquadrada.
Das histórias de amor.
Das casas grandes com cachorros grandes.
De querer ser mãe.
De querer sucesso e dinheiro.
É mais feio ainda, não ter sonho algum.
Querer viver o hoje, simplesmente porque a vida já tá rolando...
É muito chato ter que desiludir. Ter que fazer o trabalho sujo de falar isso.
De falar que a vida é isso mesmo. Que enquanto você me lê, ela acontece.
Sem sinos tocando, sem estrelas brilhando, sem trilha sonora.
E é melhor acreditar, cair na real. Aceitar e viver.
Antes que a terra faça uso da fertilidade quem tem essa sua mente, cheia de sonhos.
Kamila V.

quarta-feira, 21 de maio de 2008

Me inclua fora desse.(dia)






O céu acordou gritando pro mundo que esse seria mais um dia daqueles.
Meu cabelo também.
Minhas roupas também.
Nem maquiagem daria jeito nele.
O elevador fez um "tour" até meu destino, o térreo, acompanhada da simpatia matinal de 7 condôminos, num lugar onde cabem 8. E todo mundo sabe que elevador pra 8, só se forem 4 grávidas.
Que piada ridícula.
Voltemos ao dia...
Chegando, o porteiro me entrega em mãos, num ato solene, minhas contas do mês.
Nada como começar o dia em débito!
(Ah, está chovendo claro..detalhe importante.)
O carro passa e lava a alma.
O trânsito pára. E ninguém pára na inquietação dos pensamentos.
Ouço sobre as buzinas, carros-de-som e confusão social, os gritos mudos do blá-blá-blá mental.
Homens desejam mulheres que passam...
Mulheres desejam a roupa de outras mulheres...
Casais brigam de mãos dadas...
E acompanhando a marcha-lenta dos rostos cansados, o dia segue.
Todos seguem mesmo sem ter motivos, sabendo bem onde isso vai dar.
Nada muda, o planejado pelo destino sempre acontece.
É o almoço, a azia, o calor, as crianças no colégio, o jantar, a TV, o sono, e o novo dia...
(novo dia? piada mais ridícula ainda...)
O dia é sempre o mesmo, só espero que o lance das contas do mês fique pro ontem.
A repetição causa L.E.R. na consciência.
O beijo, bom-dia, com licença, obrigado, é o script desse teatrinho ensaiado.
E nós? meros coadjuvantes de péssima atuação.
Porque o papel principal... é sempre da mocinha.
A rotina safada.
Kamila V.

domingo, 18 de maio de 2008

Não achei no Google.


Estou perdida. E o que é pior, no tempo.
Tenho certeza que nasci na época errada, uso roupas erradas, faço coisas totalmente atemporais.
Pro meu tempo e pros meus 21.
Minha irmã riu do jeito que eu digito no MSN, riram porque eu ouço Baden, até o Google riu de mim.
Fui obrigada a me habituar com a tecnologia. Ela colocou a colher na minha goela, sem fazer aviãozinho, e de quebra um chapeuzinho cônico na minha cabeça.
Boba. Mas deixa eu explicar melhor.
Eu caço música. As mais estranhas, mais poéticas, as mais "Eu". As menos escutadas.
Tão menos, que até o Google ignora minhas buscas.
Minha idade biológica me encheu de rugas musicais e a tecnologia me encheu de perguntas.
Será que eu deveria mesmo ignorar tanto o presente e querer viver de passado? Do passado dos outros, do passado à ferro em brasa, e ficar pretérita o tempo todo?
Será que eu não deveria deixar o Google responder "Britney" pra minha pergunta?
Será que lutar à contra-gosto e contra o gosto da modernidade vai me trazer felicidade, dinheiro, amigos e tudo de mais "hi-tech" que a atualidade tem e eu não tenho, mas queria?
Não sei.
Responda-me você.
Que vê as coisas aí do alto (por isso possui o melhor campo visual de uma visão beem mais-ou menos).
Você talvez poderia chegar junto pra me tirar essas dúvidas.
Você que me fez assim tão ranzinza.
Você que sabe meus intentos e tudo me faz ver desse jeito típico do meu tipinho.
Eu prometo que escuto se você falar.
E se for por e-mail, eu prometo ler e responder.
Mas não me manda pro Google.
Kamila V.

sexta-feira, 16 de maio de 2008

O saco


Eu me percebi esses dias. E juro que tô apavorada.
Eu me dei conta que minha humanidade é perfeita pra viver em Plutão, que nem é planeta, mas é o mais longe que eu posso estar dessa mediocridade terrena.
Não consigo mais disfarçar com aquela carinha de monalisa, que me interesso pelo teu papo.
Prometo pra mim, não disfarçar mais sua chatice e que minha opinião à seu respeito não é das melhores.
Eu já tentei gostar do que as pessoas normais gostam. Já tentei rir das piadas do Tom, gostar de funk, roda-de-pagode, balada, pegar-sem-se-apegar, mas não rolou. E se esse for o clima, não quero e não vou entrar nele.
Dias atrás alguém me disse que eu consigo disfarçar numa risadinha elegante, as gafes cometidas por seres, ditos humanos, do meu meio de convívio.
Mas minha paciência tá bem perto do limite, que num esforço sobrenatural tá sendo esticado ao GG, pra eu não perder a compostura.
Não é TPM, nunca tive isso, não acredito que exista, pra merda essas garotas tepeêmicas.
É saco. Acreditem, por trás de toda essa feminilidade venusiana aparente, existe um saco.
Ele comporta dentro de si, todas as porcarias humanas. Sabe aquela besteira, aquela mentira, aquela decepção, aquele engano, aquela promessa cafajeste, que você cometeu, disse e fez pra mim? Então. Agradeça à minha paciência, pois como diriam minha adoráveis amigas do telemarketing: Eu estou estando guardando com calma tudo no saco.
Aliás, elas também tão no saco.
Mas voltando ao topo, quando eu falei do medo de mim.
É que assim. Eu to realmente preocupada com o tanto de nojeira em quilo que meu saco aguenta.
Baboseira em metros. Lágrimas em litro.
A resistência da minha paciência ( e do saco!) surpreende a mim a ao fabricante do dito cujo.
Eu tenho medo de não ter mais um saco pra viver.
Eu quero um novo, novo e vazio.
Pra poder reabastecê-lo sem medo.
Pra poder aguentar um pouco mais da novela das 8, das propagandas de banco que fazem sinal com indicador, do Faustão( a mulher dele deve ter um saco invejável da Louis Vuitton), pra poder aguentar com leveza, doçura e sorriso de Mc'garota a amolação social.
Mas o saco tá aí. Frágil, prestes a entregar-se.
E o pior de tudo, o ventilador tá ligado.
Kamila V.




quarta-feira, 14 de maio de 2008

Crítica ao excesso.


Meno lixo, menos mentira, menos sonho.
Menos bajulação, menos política, menos sono.
Menos computador, menos tilenol, menos aula faixa.
Menos nós dois, menos congestionamento, menos nota baixa.
Menos gordura localizada, menos ócio, menos roupa-suja.
Menos ladeira, menos encenação, menos promessas.
Menos suor, menos créu, menos cuidado.
Menos ciúme, menos febre, menos desconfiança.
Menos chiclete na sola, menos consumo, menos peso.
Menos religião, menos trabalho, menos distância.
Menos saudade, menos exposição, menos recados.
Menos incerteza, menos infidelidade, menos horário-marcado.
Bem menos do que é muito, porque o excesso sempre sobra.
E a gente fica sem saber o que fazer com essas coisas todas a mais.
De repente não tem mais lugar pro lixo no aterro.
Nem fôlego pra subir a ladeira.
Nem lugar pra saudade no coração.
Nem ouvidos pro créu. Nem roupa nova pro peso novo.
Nem paciência pra político na televisão.
E não se tem mais tempo, nem mais espaço.
O ambiente torna-se pequeno e o excesso amontoado.
Assim com ônibus das seis.
Assim como o mundo pra nós.
Kamila V.

segunda-feira, 5 de maio de 2008

O lado bom.



Eu deveria ter fechado o guarda-chuva pra sentir na pele o prazer que sente a terra quando se molha.
E ter tomado banho de mangueira, em vez de reclamar do verão.
Eu deveria experimentar a dor do frio e da fome, quando reclamo da blusa marrom e do arroz com feijão.
Eu deveria responder a todas perguntas do falante que sentou ao meu lado no ônibus e descobrir com isso coisas mais interessantes que minha medíocre solidão.
Eu não deveria ter trocado aquele amigo que trocou de opinião.
Eu não deveria ter chorado nos tombos que tive; Com eles aprendi a cair com jeito.
E aprendi que não importa o tamanho da minha indignação, da minha raiva,da minha indiferença, do meu choro, não importa minha greve de fome, nem a qualidade dos meus reclames.
A vida e as circunstâncias são imutáveis.Quem deve mudar sou eu e esse meu jeito cego de ver vida.
Tenho que dizer "eu te amo", antes que a pessoa feche a porta.
Tenho que viver o dia, antes que a noite o roube de mim.
Tenho que pular corda, enquanto minha coluna permite.
Tenho que realizar, quando surgir a oportunidade de parar de sonhar.
Tenho que participar dos momentos importantes das pessoas que me importam.
Tenho que deixar marcas, e levar as suas comigo.
Tenho que ser jovem, até que as rugas me provem o contrário.
Tenho que discutir com você até a gente fazer as pazes.
Tenho que rir até doer a barriga.
No jogo, passar em todas as fases.
Caminhar na praia enterrar o pé n'areia.
Comer jiló, falar de boca cheia.
Pedir o troco a menos.
Devolver o troco a mais.
Parar de reclamar da política.
De tirar o lugar na fila,de quem tá atrás.
Posso criar ilusões, ou viver com graça a minha realidade.
Posso alimentar minha insatisfação, ou sossegar com o que tenho.
Posso facilitar pra Deus, estando aí pro que der e vier, da parte dele.

Quero não ter que duvidar das possibilidades, nem ter de esperar a chegada de dias melhores.
Quero meu melhor dia pra ontem.
Debaixo de chuva, de calor, desarrumada e despreparada.
Quero ser o melhor que puder, naquilo que nem sei fazer.
Quero descobrir o lado bom de sofrer.
Se ele tiver mais que um lado, é claro.
Quero aprender sobre decepções, sem maiores dramas.
Quero aceitar esse teu jeito e rir da nossa imperfeição.
Quero fazer programa de índio.
Enxergar beleza na escuridão.
Quero perder a mania de falar mal da segunda-feira e do segundo lugar.
E num repente, botar nossa tristeza pra andar.
Espero que ainda dê tempo.
De te agradecer por aquela crítica.
De tomar banho de chuva.
De viver mais um verão.
De comer feijão.
De cair com jeito.
De me arrepender do não feito.
De tentar ser melhor.
De cantar sem pensar no tom.
E descobrir que tudo na vida tem um só lado, o lado bom.
KamilaV.